terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Salvos por Dois Cachorros

Em março de 2010 participei como tradutor de uma missão da Loma Linda University em direção ao Rio Negro. Eu estava indo para o quarto período de Medicina, então também estava interessado em acompanhar os atendimentos médicos. Numa missão anterior da LLU, um menino de uma dessas comunidades foi diagnosticado com uma cardiopatia congênita, tetralogia de Fallot. Ele não teria chance de sobreviver se não fosse operado. A Universidade estava ajudando a providenciar a cirurgia do menino, e uma jornalista de lá, Patricia, estava filmando uma matéria sobre o caso. 
Patricia gravando na comunidade

Dr. Ricardo Faria, um dos médicos brasileiros que estavam na missão, se lembrou de que em 2001, um grupo de voluntários do Hospital Adventista de Manaus havia diagnosticado a mesma doença em outra criança, durante uma viagem humanitária numa comunidade próximo de onde estavam. A criança, chamada Gisele, foi operada e ficou bem (inclusive mais tarde foi batizada e se tornou Adventista do Sétimo Dia). Então ele deu a ideia para Patricia de também filmar a história da menina, junto com a do menino. Todos concordaram. Saracá, a comunidade onde Gisele morava, ficava descendo o Rio Negro, de onde estávamos. A maior parte do grupo ficou no barco Comte Shaloom, do Sr. Edmilton, enquanto eu, Dr. Ricardo, Patricia, uma amiga dela que seria a repórter, e um dos tripulantes, saímos em direção a Saracá numa das voadeiras.
Voadeira
Estávamos no meio da tarde quando de repente o motor começou a enfraquecer e finalmente a voadeira parou. A "lei do rio", regra não escrita, baseada no bom senso, diz que quem navega a favor da correnteza vai pelo meio do rio, e quem vai contra, sobe pelas margens. Isso faz sentido porque no meio do rio, a velocidade da corrente é maior e ajuda quem desce, dificultando quem sobe. Estávamos indo rio abaixo, então nos afastamos da margem, não sei dizer quanto. O senhor que era da tripulação começou a mexer no motor, tentando fazê-lo voltar e nada. 
Motor parado

Nenhum barco passava para pedirmos ajuda. Dr. Ricardo também tem experiência com barcos e os dois tentavam achar uma solução. As americanas estavam meio perdidas com o que estava acontecendo. Oramos, mas o barco não voltava. Ia escurecer dentro de pouco tempo, e precisávamos chegar na margem. Eu dei a ideia pro Dr. Ricardo de me jogar no rio e ir nadando puxando o barco aos poucos para a margem, com uma corda. Ele consentiu e aos poucos fomos chegando perto da margem e pudemos desembarcar. 
Indo pra margem

Havia uma praia cercada pela mata e encalhamos o barco lá. O senhor da tripulação começou a abrir o motor com várias chaves, e Dr. Ricardo saiu procurando lenha para fazer uma fogueira, caso precisássemos passar a noite ali. Acontece que não tínhamos nada para fazer fogo. Foi quando Dr. Ricardo me falou pra perguntar em inglês para as estrangeiras se elas tinham na bolsa delas algo para se fazer fogo. Quando expliquei o porquê foi que elas começaram a se desesperar. Colocaram os coletes e ficaram com o apito prontas pra fazer barulho caso algum barco passasse.


Já ia quase escurecendo quando lá para o meio do rio estava subindo um caçador com seus dois cachorros em uma canoa. Ele tinha um galho em pé na frente da canoa, me disseram que ele usava como "vela" para aproveitar o impulso do vento e economizar combustível. Ele ia seguindo direto e não nos viu. Talvez por estar sentado do lado do motor barulhento, também não conseguiu ouvir nossos gritos e apitos. Já estava quase passando quando os cachorros nos notaram na margem e chamaram a atenção dele. Então ele deu meia volta e nos rebocou de volta até o Comte Shaloom. 
O Caçador e a equipe de volta ao Comte Shaloom

Os Cachorros do Caçador
Já estava escuro quando chegamos. Dr. Ricardo o pagou pela carona, e eu dei para ele a minha Bíblia. Nesse Livro Sagrado, Deus usou corvos para alimentar Elias, um grande peixe para salvar Jonas, uma jumenta para proteger Balaão, e eu acredito que nessa viagem Ele usou aqueles cachorros para nos socorrer. Que possamos nos colocar nas mãos de Deus e sentir Sua guia em nossas vidas.

Gabriel

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